Após anos de batalha judicial, Supremo põe fim às manobras da concessionária e garante economia no bolso do consumidor ilheense
Decisão unânime da Primeira Turma, com trânsito em julgado em outubro, determina redução de 80% para 40% em Feira de Santana; autor de lei idêntica em Ilhéus divulga parecer e cobra aplicação imediata do precedente
O Supremo Tribunal Federal encerrou quase uma década de disputa judicial ao confirmar, em decisão definitiva e unânime, que municípios baianos têm competência constitucional para limitar a tarifa de esgotamento sanitário cobrada pela Embasa
(Empresa Baiana de Águas e Saneamento). O caso, relatado pelo ministro Luiz Fux, transitou em julgado em 17 de outubro de 2025 e determina a redução do percentual de 80% para 40% sobre o valor da conta de água — economia de 50% para os consumidores.
O precedente foi firmado no julgamento do ARE 1.542.507/BA, que tratou da Lei Municipal n° 326/2016 de Feira de Santana, de autoria do então vereador Pablo Roberto, atual vice-prefeito da cidade. A Primeira Turma do STF negou provimento a todos os recursos interpostos pela concessionária estadual, aplicando multas processuais por conduta protelatória e determinando o cumprimento imediato da legislação municipal.
A decisão tem impacto direto sobre outros municípios baianos que aprovaram legislações semelhantes. Em Ilhéus, no litoral sul do estado, o advogado e ex-presidente da Câmara Municipal, Jerbson Moraes, autor da Lei n° 4.112/2021, divulgou parecer jurídico no qual sustenta a aplicabilidade imediata do precedente ao caso ilheense.
"A identidade substancial entre os casos inequívoca. Ambas as leis possuem conteúdo normativo idêntico, a controvérsia constitucional é a mesma e a concessionária questionada é a mesma
— a Embasa. O precedente torna juridicamente indiscutivel a obrigatoriedade de cumprimento da lei de Ilhéus", afirma Moraes no documento.
Tramitação no STF
O processo percorreu longo caminho até a decisão
definitiva. A Lei Municipal de Feira de Santana foi aprovada em maio de 2016, mas a Embasa sustentou sua invalidade e manteve a cobrança de 80%, argumentando conflito com legislações federais. O caso chegou ao Tribunal de Justiça da Bahia, que em 2020 reconheceu a constitucionalidade da norma.
No STF, a Embasa teve todos os recursos negados. Em 28 de março de 2025, o ministro Luiz Fux negou seguimento ao agravo. Em junho, a Primeira Turma rejeitou agravo interno por unanimidade. Em agosto, embargos declaratórios foram rejeitados com multa de 2% por caráter protelatório.
Em outubro, novos embargos não foram conhecidos e a multa foi ampliada para 4%, com determinação de certificação imediata do trânsito em julgado.
No voto condutor, o ministro Fux foi categórico: "Fica a empresa concessionária responsável pelos serviços de esgotamento sanitário obrigada a cobrar o percentual máximo de 40% sobre o consumo de água, tarifa de serviço de esgotamento sanitário no Município de Feira de Santana".
Fundamentos jurídicos
O STF baseou sua decisão em quatro eixos centrais.
Primeiro, reconheceu a competência municipal prevista no artigo 30, incisos I e V, da Constituição Federal, que permite aos municípios legislar sobre serviços públicos locais e proteção ao consumidor. Segundo, confirmou a validade da lei municipal, entendendo que ela não viola diretrizes federais do Marco Legal do Saneamento.
O tribunal também aplicou as Súmulas 280, 282 e 356, por ausência de prequestionamento e por tratar de lei local, inviabilizando novo recurso extraordinário. Por fim,
considerou que os embargos sucessivos da Embasa foram protelatórios, resultando nas multas processuais.
No parecer divulgado, Moraes cita doutrina do jurista Celso Antônio Bandeira de Mello para reforçar o argumento:
"A modicidade tarifária é um dos mais relevantes direitos do usuário, pois, se for desrespeitada, o próprio serviço terminará por ser inconstitucionalmente sonegado". O advogado sustenta que o caso se torna "referência nacional em controle tarifário no saneamento básico".
Impacto econômico
A redução da tarifa representa alívio significativo no orçamento das famílias. Na prática, um consumidor que paga
R$ 100 de água e R$ 80 de esgoto (80% do valor da água) passará a pagar apenas R$ 40 pelo serviço de esgotamento sanitário — economia de R$ 40 por mês, ou R$ 480 por ano.
O percentual de 80% praticado na Bahia está entre os mais elevados do país. A Embasa argumenta que o valor é necessário para custear a operação, manutenção e ampliação do sistema de saneamento, mas críticos apontam que não há transparência composição proporcionalidade com a qualidade do serviço prestado.
Segundo dados da própria concessionária, apenas 58% dos imóveis de Feira de Santana contam com coleta e tratamento adequado de esgoto. Em Ilhéus, a cobertura é semelhante, o que levanta questionamentos sobre a cobrança de tarifa cheia para usuários sem acesso pleno ao serviço.
Restituição de valores
Além da redução nas contas futuras, consumidores podem ter direito à restituição de valores pagos a maior. No parecer, Moraes sustenta que moradores de Ilhéus que pagaram 80% de tarifa de esgoto desde a vigência da Lei n° 4.112/2021, em junho de 2021, podem pleitear ressarcimento com correção monetária e juros.
O consumidor que desejar cobrar o retroativo pode ingressar com ação individual na Justiça ou aguardar eventual ação coletiva sobre o tema. Órgãos como Procon e Ministério Público também podem ser acionados para fiscalizar o cumprimento da lei e intermediar acordos.
Próximos passos
Com o trânsito em julgado e a baixa dos autos ao
Tribunal de Justiça da Bahia em 21 de outubro, a expectativa é de que a Embasa implemente a redução tarifária de forma imediata nos municípios com legislação aprovada. Em Feira de Santana, o vice-prefeito Pablo Roberto anunciou que foi dado entrada no pedido de execução da decisão.
Em Ilhéus, Jerbson Moraes afirma que decisão
"fortalece a autonomia legislativa do município" e "garante uma tarifa justa, transparente e proporcional para os consumidores". O advogado cobra que a Embasa aplique o limite de 40% imediatamente, sob pena de responsabilização.
"Qualquer tentativa de descumprimento pela Embasa encontra-se contrária ao entendimento consolidado pela mais alta Corte do pais. A Lei Municipal n° 4.112/2021 entra definitivamente para a história como um dos maiores marcos de defesa do consumidor no município de Ilhéus", afirma o parecer.
ENTENDA O CASO
O que foi decidido: O STF confirmou que municípios têm competência constitucional para legislar sobre tarifas de serviços públicos de interesse local, incluindo saneamento. A Embasa é obrigada a cumprir leis municipais que limitam a tarifa de esgoto a 40%.
Processo: ARE 1.542.507/BA, relatoria do Ministro
Luiz Fux, Primeira Turma. Trânsito em julgado em 17/10/2025.
Impacto: Redução de 50% na tarifa de esgoto para consumidores de municípios com leis aprovadas.
Possibilidade de restituição de valores pagos a maior.
Municípios beneficiados: Feira de Santana (Lei 326/2016) e Ilhéus (Lei 4.112/2021), entre outros com legislação semelhante.
CRONOLOGIA DO PROCESSO
Maio/2016: Aprovação da Lei 326/2016
Junho/2021: Promulgação da Lei 4.112/2021 em Ilhéus
Julho/2020: TJ-BA reconhece constitucionalidade da lei de Feira
28/03/2025: Min. Luiz Fux nega seguimento ao agravo da Embasa
14/06/2025: Primeira Turma rejeita agravo interno por unanimidade
22/08/2025: Embargos rejeitados com multa de 2%
17/10/2025: Trânsito em julgado certificado; multa ampliada para 4%
21/10/2025: Baixa definitiva dos autos ao TJ-BA
DOCUMENTO
Leia a integra do parecer jurídico elaborado pelo advogado Jerbson Moraes sobre a aplicabilidade do precedente do STF à Lei Municipal n° 4.112/2021 de
Ilhéus (arquivo anexo)
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